segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Sentimentalidades

'Sinto sua falta'.
"... Era a primeira vez que lhe escreviam aquelas sentimentalidades, e
o seu orgulho dilatava-se ao calor amoroso que saía delas, como um
corpo ressequido que se estira num banho tépido; Sentia um acréscimo
de estima por si mesma, e parecia-lhe que entrava enfim numa
existência superiormente interessante, onde cada hora tinha o seu
encanto diferente, cada passo conduzia a um êxtase, e a alma se cobria
de um luxo radioso de sensações!" (Eça de Queiroz)

E por que se perdem as sentimentalidades?
Por que amadurecemos ao ponto de esquecermos nossas mais puras, alegres e inebriantes emoções?
Ora pois se estar vivo não é esse sentimento pulsante de querer e se sentir querido e querer compartilhar tudo com o outro?

No exercício de te encantar, tanto me encanto, que fico encantadora aos olhos teus.
'O amor é uma companhia.
Já não sei andar só pelos caminhos,
Porque já não posso andar só.
Um pensamento visível faz-me andar mais depressa
E ver menos, e ao mesmo tempo gostar bem de ir vendo tudo.
Mesmo a ausência dela é uma coisa que está comigo.
E eu gosto tanto dela que não sei como a desejar.
Se a não vejo, imagino-a e sou forte como as árvores altas.
Mas se a vejo tremo, não sei o que é feito do que sinto na ausência dela.
Todo eu sou qualquer força que me abandona.
Toda a realidade olha para mim como um girassol com a cara dela no meio'.
Fernando Pessoa por Alberto Caeiro

Você tem estado nos meus pensamentos. E pensar em ti tem sido tão natural quanto respirar.
Depois dos primeiros beijos, durmo e acordo contigo no pensamento. Na verdade, imaginando o dia em que faremos isso juntos (dormir e acordar).

Será que vais enroscar as pernas em minhas pernas?
Ou vamos dormir de ladinho, como um molusco em sua concha?
E caso não consigamos, então dormiremos cada um de seu jeito, mas os corpos se aproximarão buscando o aconchego no meio da noite?

Sua mão vai encontrar meu peito pelo caminho, não mais animada pelo tesão, pois está saciada. Mas buscará a batida do meu coração, porque mão adora sentir a vida que adormece.

E meu nariz vai buscar o seu peito, porque sou toda olfato e adoro cheiro bom para dormir mais leve.

Então adormeceremos...
Quantas vezes acordaremos só para sentir a respiração do outro?
Quem acordará primeiro?
Se fores tu, vais se chegar por trás, encostando-se em mim e mostrando que estais realmente acordado?
Ou vais dedilhar tua mão pelas minhas pernas, minhas costas, meu pescoço, depositando beijinhos e leves mordidas, para mostrar que tens fome?

Ah, não me acorde de qualquer jeito. A ousadia ainda dorme. E nos andares de baixo o silêncio é total. É preciso acordar os andares de cima. Com um nariz que ataca um pescoço, com uma boca que ataca uma nuca, com dentes que mordiscam levemente. E com palavras que não deixam dúvida que o novo dia te despertou pra me amar.

E se eu acordar primeiro? conta-me logo de como és ao despertar, mas aviso-te, não te preocupas. Vou procurar não fazer barulho. Mas vou me aproximar pra sentir seu corpo quente. Vou cheirar mãos, vou me enroscar em abraços. E se os andares todos estiverem acordados, então vou em busca da tua mais pura sexualidade em forma de carne.
Serás minha primeira refeição.

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